domingo, 16 de janeiro de 2011

"A DEVIDA COMÉDIA" - Será mesmo assim?!...

Por estes dias houve um amigo, daqueles com quem troco uns "mails", que me ajudam a perceber o que se passa em meu redor, me remeteu o que aqui vos deixo e me deixou deveras pensativo e preocupado, para quem como eu sempre valorizou as "juventudes" e sempre acreditou que foram os "homens de amanhã", em todos os tempos, a transformar o mundo para melhor, partilhando e desenvolvendo novas ideias e novos saberes.
Pergunto: Será mesmo assim?!...
Estaremos a contribuir para que assim seja?!...
Ainda estaremos, pais, avós, familiares, professores, a tempo de emendar a mão?!...
Aos meus leitores deixo o desafio: Façam uma análise ao vosso comportamento, ao papel que têm desempenhado na educação do vosso filho, neto, educando e verifiquem qual o sentido da vossa actuação!...
Eu já fiz a minha e não estou muito certo que sempre tenha seguido o melhor caminho.
Está na altura de corrigir o que é passível de corrigir.
Ao contrário do que possam pensar, os nossos filhos, netos, educandos, agradecer-nos-ão um dia...

O texto intitulado "A DEVIDA COMÉDIA" parece ser da autoria do jornalista da Visão, Miguel Carvalho.

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Um dia destes, vão ser os paizinhos a ir parar ao hospital com um pontapé e um murro das criancinhas no olho esquerdo

Criancinhas

A criancinha quer Playstation. A gente dá.
A criancinha quer estrangular o gato. A gente deixa.
A criancinha berra porque não quer comer a sopa. A gente elimina-a da ementa e acaba tudo em festim de chocolate.
A criancinha quer bife e batatas fritas. Hambúrgueres muitos. Pizzas, umas tantas. Coca-Colas, às litradas. A gente olha para o lado e ela incha.
A criancinha quer camisola adidas e ténis nike. A gente dá porque a criancinha tem tanto direito como os colegas da escola e é perigoso ser diferente.
A criancinha quer ficar a ver televisão até tarde. A gente senta-a ao nosso lado no sofá e passa-lhe o comando.
A criancinha desata num berreiro no restaurante. A gente faz de conta e o berreiro continua.
Entretanto, a criancinha cresce. Faz-se projecto de homem ou mulher.

Desperta.

É então que a criancinha, já mais crescida, começa a pedir mesada, semanada, diária. E gasta metade do orçamento familiar em saídas, roupa da moda, jantares e bares.
A criancinha já estuda. Às vezes passa de ano, outras nem por isso. Mas não se pode pressioná-la porque ela já tem uma vida stressante, de convívio em convívio e de noitada em noitada.
A criancinha cresce a ver Morangos com Açúcar, cheia de pinta e tal, e torna-se mais exigente com os papás. Agora, já não lhe basta que eles estejam por perto. Convém que se comecem a chegar à frente na mota, no popó e numas férias à maneira.

A criancinha, entregue aos seus desejos e sem referências, inicia o processo de independência meramente informal. A rebeldia é de trazer por casa. Responde torto aos papás, põe a avó em sentido, suja e não lava, come e não limpa, desarruma e não arruma, as tarefas domésticas são «uma seca».
Um dia, na escola, o professor dá-lhe um berro, tenta em cinco minutos pôr nos eixos a criancinha que os papás abandonaram à sua sorte, mimo e umbiguismo. A criancinha, já crescidinha, fica traumatizada. Sente-se vítima de violência verbal e etc e tal.
Em casa, faz queixinhas, lamenta-se, chora. Os papás, arrepiados com a violência sobre as criancinhas de que a televisão fala e na dúvida entre a conta de um eventual psiquiatra e o derreter do ordenado em folias de hipermercado, correm para a escola e espetam duas bofetadas bem dadas no professor «que não tem nada que se armar em paizinho, pois quem sabe do meu filho sou eu».

A criancinha cresce. Cresce e cresce. Aos 30 anos, ainda será criancinha, continuará a viver na casa dos papás, a levar a gorda fatia do salário deles. Provavelmente, não terá um emprego. «Mas ao menos não anda para aí a fazer porcarias».
Não é este um fiel retrato da realidade dos bairros sociais, das escolas em zonas problemáticas, das famílias no fio da navalha?
Pois não, bem sei. Estou apenas a antecipar-me. Um dia destes, vão ser os paizinhos a ir parar ao hospital com um pontapé e um murro das criancinhas no olho esquerdo. E então teremos muitos congressos e debates para nos entretermos.

Artigo publicado na revista VISÂO online
 
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